Indicação de livro: “Aspectos do Feminino” do Jung

O livro “Aspectos do Feminino” é um livro do Jung (ou seja, dispensa apresentações), que foi lançado recentemente pela Editora Vozes. Esse é o primeiro dos livros do Jung que iremos indicar que apresenta um modelo diferente que estamos acostumados que é o de coletânea temática (muito comum em outros países) tanto que este volume é baseado na edição da língua inglesa de 1982!

Neste livro são coletados e organizados os principais textos onde Jung aborda o Feminino ao longo de sua carreira, o primeiro texto é de 1921 e o último 1951. Assim, temos uma dimensão da evolução suas ideias. Com o avanço dos estudos do feminino na contemporaneidade esse livro é um objeto de pesquisa prático e acessível. O prefácio escrito por Walter Boechat nos auxilia a compreender a evolução das ideias do Jung acerca do Feminino e situando o leitor no contexto de cada capítulo.

Vale a pena ressaltar que para o leitor ter contato com as ideias deste livro seria necessário recorrer a 4 livros das obras completas! Assim, este livro é uma excelente aquisição para todos que tiverem interesse neste tema.

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DETALHES DO PRODUTO (Do Site da Vozes)

ISBN9788532662682
Dimensoes13.7cm x 21.0cm x 1.2cm
Edicao1
NrPaginas248
Selo EditorialEditora Vozes
ColecoesOBRAS COMPLETAS DE CARL GUSTAV JUNG
TemasPsicologia

Aspectos do feminino oferece uma série de artigos e extratos dos escritos de Jung que transmitem suas visões sobre o feminino e sobre temas que são intrínsecos ou relacionados: casamento, eros, a mãe, a virgem/donzela e o conceito de anima/animus, que é uma característica central da teoria da estrutura da personalidade de Jung. Esta seleção de textos abordando as várias faces do feminino segundo a teoria psicológica de C.G. Jung constitui importante ferramenta para reflexão e aprofundamento do universo feminino e sua relação com o universo masculino em uma época em que os modelos tradicionais de virilidade e feminilidade se dissolvem e requerem uma nova atitude coletiva.

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Limites: Contornos, Margens e Fronteiras

Em nossa vida cotidiana falamos muito em limites, nos mais diferentes contextos e sentidos: falamos em ter limites, colocar limites, reconhecer os limites, estar no limite e superar os limites etc. A ideia de limite pode comportar uma vastidão de possibilidades figurativas e existenciais.  Assim, gostaria de pensar a noção de limite sob a perspectiva da psicoterapia, para tanto vou explorar a ideia de limite em três imagens ou perspectivas: o contorno, a margem e a fronteira

Antes de abordamos essas imagens, gostaria de lembrar a etimologia, a origem, da palavra limite, ela vem do latim limes que indicava o caminho entre dois campos – o que chamamos popularmente de “caminho da roça” ou mesmo de trilha. Dessa imagem, o limes,-ites, é um marco que simultaneamente indica tanto o fim do campo, quanto o início do outro campo, assim com a interseção, o encontro  dos dois campos.

O limite, o limes, como o caminho entre dois campos, não só marcava o início ou o fim de um território, mas indicava também a forma desse espaço ou campo. Posteriormente, os cartógrafos, utilizavam os caminhos, rios e montanhas para desenhar os marcos, os limites que davam forma aos reinos e territórios. Assim, podemos compreender o primeiro significado importante da ideia de limite, que é o contorno.

Conhecendo o próprio corpo com diversão - Papo da Professora Denise

O contorno expressa a forma, expõe a figura. Precisamos antes fazer uma distinção: fomos acostumados a pensar no contorno externo, vindo do social das regras, dando a forma esperada pelas expectativas coletivas. Esse é o contorno mais aparente, intimamente relacionado a persona, que media a relação social mais adequada, entre eu e o outro. Contudo, há outro contorno mais sutil que é tão importante quanto o primeiro, que é o contorno interno, que delineia o ego e suas relações.

Duas das funções mais importantes do ego é a autopercepção e o autorreconhecimento. Para essas funções é necessário que o ego tenha um contorno claro, capaz de distinguir e perceber sensações do corpo, sentimentos e complexos– uma vez delineados, o ego pode se relacionar com eles, sem que seja tomado pelos mesmos. Quando esse contorno não é delineado na infância, o indivíduo vai apresentar uma dificuldade de expressão dos afetos e sentimentos (quer seja pelo excesso ou pela falta), assim como de se perceber na relação com os outros. Quando recebermos um contorno adequado, isto é, quanto nosso ego é constituindo de forma estável, podemos ter a sensação de integridade e autoestima necessárias a uma vida saudável.

 Muitas vezes, a função da psicoterapia é ajudar a criar contornos para o paciente, para ele possa se perceber, desenvolvendo a própria autoimagem, autoconceito e autocuidado. Esse contorno, essa experiência de ter continência, de estar em si que é tão importante. Os contornos nos dão forma interna e externa.

Paisagem Natural Do Verão Com Rio Pantanal Em Florida, EUA Imagem ...

Outra imagem para pensar o limite é a margem, escolhi essa imagem visualizando um rio. A margem indica o caminho, o espaço de fluxo. Em suas margens o rio produz vida, movimento, nutrição. Quando enche, quando transborda pode produzir destruição e morte.

A margens delineiam o curso do rio, seu movimento. Assim também é nossa vida, para seguir o curso precisamos compreender e respeitar nossas margens. Gosto de pensar uma margem como nosso corpo e nossas necessidades físicas;   a outra é nossa psique e suas necessidades espirituais. Enquanto estivermos respeitando nossas margens teremos segurança que propicia a vida, o fluxo necessário para seguirmos em frente, vivendo nosso processo de individuação criativamente, dentro de nossos limites naturais.

Nossa vida cotidiana, frequentemente, nos impele ao excesso, a transbordar e romper com nossas margens. Seja qual for o excesso (trabalho, comida, religião, relacionamento) ele produzirá sofrimento e dor. Muitas vezes, levados pelos excessos, nos distanciamos de nossas margens, de nosso curso natural, a tarefa da psicoterapia é nos ajudar e reencontrar nossas margens, e nesse sentido Jung afirmou “somente aquilo que realmente somos tem o poder de curar-nos”.   

Portal dos Mitos: Jano
Janus

A terceira imagem do limite é a fronteira. A fronteira indica o fim e o início, ou marca os inícios. Na mitologia romana, temos uma interessante divindade dos limites e das transições, o deus Janus ou Jano. A peculiaridade de Janus era justamente por ser um deus bifronte, isto é, tinha duas faces uma que dirigia para frente e outra para trás da cabeça, ou seja, ele olhava para frente e para trás, passado e futuro, para dentro e para fora. Janus era, por excelência, o deus dos começos – pois, todo limite nos conduz ao novo, ao início. Por isso mesmo, nosso primeiro mês do ano, janeiro tem seu nome em homenagem ou referência a Jano.

A fronteira nos coloca diante da possibilidade das transições e da transcendência. Estamos sempre atravessando novas fronteiras sejam elas do tempo, dos espaços das atitudes. Essas travessias nos colocam diante do mistério da vida, nos desafiando a viver. A cada manhã atravessamos várias fronteiras, mas, geralmente não notamos isso. A sabedoria antiga nos ensinava que ao atravessar qualquer fronteira já estávamos sob o julgamento de Deus – o obter o sucesso ou o retorno seguro só aconteceria “se Deus quiser”.  

Assim, sem atravessar os limites, sem ultrapassar as fronteiras não atenderemos o chamado de nossa aventura, não conheceremos a vontade de Deus, e o mistério da vida não se revelará. A função da psicoterapia é encorajar a travessia, é dar suporte ao enfrentamento do novo, auxiliando ao indivíduo nesse novo caminho que se abre. Nessas três imagens o contorno, a margem e a fronteira temos referencias importantes para compreendermos que os limites não se reduzem a normas e regras, mas expressam aspectos fundamentais da vida e os quais não há individuação.

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Fabrício Fonseca Moraes (CRP 16/1257)

Psicólogo Clínico de Orientação Junguiana, Especialista em Teoria e Prática Junguiana(UVA/RJ), Especialista em Psicologia Clínica e da Família (Saberes, ES). Diretor do Centro de Psicologia Analítica do CEPAES. Formação em Hipnose Ericksoniana. Coordenador do “Grupo Aion – Estudos Junguianos”  desde 2012 Atua em consultório particular em Vitória desde 2003.

Contato: 27 – 99316-6985. /e-mail: fabriciomoraes@cepaes.com.br/ Twitter:@FabricioMoraes

http://www.cepaes.com.br

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Livro: “Morte e renascimento da ancestralidade indígena na alma Brasileira”

A Editora Vozes está com um super lançamento que é o livro “Morte e Renascimento da Ancestralidade Indígena na Alma Brasileira” Org. por Humbertho Oliveira. Este livro agrega trabalhos apresentados no XXV Congresso da AJB em Bento Gonçalves.

Acredito que este seja o segundo livro da “Coleção Jung contemporâneo” – que teve como primeiro livro “Desvelando a Alma Brasileira” também organizado pelo Humbertho Oliveira, um projeto da Associação Junguiana do Brasil. Que também vale a pena conferir!

Para adquirir entre em contato com a Editora Vozes, acima estão os contatos da loja de Belo Horizonte, que é nossa parceira, vocês serão super bem atendidos! Não deixe de falar que você que viu a divulgação nas redes do CEPAES 😉

Veja o sumário do livro!

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Conversão, Desconversão e Representações Arquetípicas

Estudando o livro “Mitologemas” de James Hollis no Grupo Aion, surgiu uma discussão interessante que gostaria de amplia-la um pouco. Essa discussão, até pela linguagem metafórica utilizada nos levou a amplificar a dinâmica simbólica e pensar um pouco sobre  os processos de conversão.

No capitulo intitulado “Deuses”, Hollis faz leitura das forças psíquicas, em outros tempos, eram nomeadas como “deuses”. A energia psíquica basal, fundamental da experiência psíquica, foi denominada por Jung de arquétipos, mas em outros tempos a intuição original deu contornos a essas energias que afetavam a todos de deuses. A energia em si não se modificava, ou se perdia, mas se transitava em direção a diferentes “cascas”, roupagens ou representações. 

Nesse contexto, Hollis afirma que

Para os crentes de verdade, ou para os preguiçosos e insensíveis, uma tal utilização dos deuses parece blasfema por ser aparentemente o deus tribal de outra pessoa, e não o deles. No entanto, eles violaram o primeiro mandamento: nao colocar nenhum deus acima de Deus. O deus que eles adoram é o deus tribal, não o deus que destrói a si mesmo para uma reificação e vai para o subterrâneo em busca de outra forma. Eles cometem o mais antigo dos pecados religiosos, a idolatria, ao adorar a imagem de deus que eles criaram.

Quando olhado de modo arquetípico, um deus é a imagem que surge de uma experiência profunda, um encontro com o mistério. Por isso, a divindade está sempre renovando a si mesma. Como é que se pode consertá-la? Ela é energia, não imagem. A imagem é apenas a casca transitória da divindade. A divindade transborda da casca, confere numinosidade a ela, e quando o ego humano busca consertá-la, adorá-la e constringi-la aos serviços da agenda de segurança do próprio ego, o deus “morre”, o que quer dizer, ele abandona a casca para reencarnar em outro lugar. Esse é o significado do tema da “morte de Deus”, que pode ser encontrado nas mitologias antigas de todos os povos, muito antes do pronunciamento de Nietzsche na metade do século dezenove.

Tal reconhecimento da morte de Deus é, por um lado, uma simples observação de como uma imagem particular tornou-se tão concreta, tão constringida a ponto de não mais mexer com o coração e o espírito das pessoas. (HOLLIS, 2005, 108)

Esse texto é descreve como um símbolo (ou representação arquetípica) pode ser desligado de sua fonte ou matriz arquetípica. Essa desconexão produz um estado de esvaziamento, contudo, a energia originária(do arquétipo) não se perde, se torna inconsciente, não-representada – podendo empobrecer a consciência. A representação pode se manter como um sinal, uma referência desprovida intuição, afeto e emoção que são expressões da energia arquetípica.  Pode haver uma transição para outro campo representacional, manifestando-se em outras formas ou representações. Podemos pensar a transição e amplia-la para a nomenclatura das religiões precisamos pensar um pouco sobre a noção de conversão religiosa.

A conversão é considerada um dos pontos cruciais da vivência religiosa.

a conversão envolve mudança no sistema de valores e visão de mundo (Gomes, 2011). O novo converso assume novas práticas, novos costumes e novas atitudes diante da vida, fenômeno este que representa para a vida do converso “uma divisão de antes e depois da conversão” (Alves, 2005, p.75). A conversão também se caracteriza por novos esquemas de significação; a conversão é “um processo psicossocial que se caracteriza pela desestruturação de esquemas de significação, seguido pela adoção de outro, estruturalmente distinto do primeiro” (…). (FREITAS; HOLANDA, 2014, p.94)

Na psicologia analítica falamos da conversão a partir de seu termo

Escolhas… | by Daniel Mendes | O Rascunhador | Medium

grego, metanóia, como uma expressão da emergência do Self e do processo de individuação. O processo de mudança ou transformação em relação ao podem ser nomeadas como “crises de conversão”. Estas implicariam numa dada atitude interior resultante de a falta de significação que pode se manifestar num sentimento de insuficiência, incompletude relacionada a própria experiência consigo mesmo ou com a realidade em termos de ego. Ávila(2007) fala sobre tipos de conversão:

Baseadas em experiências dramáticas: Se caracterizariam por experiências críticas suscitadas externamente que poderiam ser negativas ou positivas, (tragédias naturais, conflitos armados, acidentes). Diante dessas experiências podem surgir uma significação religiosa como elaboração de tal situação.

Baseadas na Solução para problemas pessoais: Se caracterizariam por situações ou experiências críticas internas. Ou seja, pela culpa, problemas físicos ou psicológicos que encontrariam uma significação ou resolução a partir de uma experiência religiosa.

– Baseadas em Experiência Mística: são caracterizadas pela experiência mística ou êxtase que irrompe da realidade interna trazendo uma nova percepção sobre o individuo e sua realidade.

– Revival ou “despertar religioso”: São movimentos internos ao grupo religioso onde o despertar como um “re-conversão” atua sobretudo de dentro pra fora, em grupo onde o agente catalisador é um líder religioso, que potencializa tanto os sentimento de fé/esperança quanto de culpabilidade. 

Conversão à incredulidade ou desconversão: a desconversão ou apostasia se apresentaria como características uma crise de fé, reflexão e abandono – seguida de uma mudança de percepção e compreensão da realidade. Esse processo está associado com o desenvolvimento de novas relações interpessoais, relações com a realidade exterior ao grupo e a desilusão. 

A conversão e a “desconversão” apontam para dois pólos da dinâmica do símbolo: a emergência e a o declínio.

As conversões apontam para a produção de significado/sentido ou de vida simbólica que essa experiência produz no indivíduo.  A qualidade da experiência religiosa é fundamental, Ávila(2007) nos chama atenção para as formas de viver a religiosidade, ele indica duas possibilidades: uma religiosidade funcional que se baseia no busca por sanar as necessidades do individuo – que daria contornos pessoais a experiência com o sagrado. E a outra, a religiosidade como uma experiência de encontro sustentaria uma expansão da experiência, a busca/encontro de um sentido de vida. Assim, a motivação que conduz ao processo de conversão vai estar relacionado com a manutenção ou não da experiência com o numinoso (sagrado).

Para a psicologia junguiana a psique possui uma função religiosa, isto é, uma função criadora de símbolos – estes podem ser compreendidos a partir da religião. Jung compreendia a religião como expressão da psique, que todos os temos e lugares produziu representações e imagens daquilo que seria o inefável, que chamamos também de do sagrado. A religião seria uma “atitude do espirito humano(…) transformada pela experiência do numinoso” (JUNG, 1980, p.4). Assim, a conversão indica mudanças importantes na dinâmica psicológica do indivíduo, compreende-las auxiliam ao clinico compreender o momento que o indivíduo atravessa, sua elaboração simbólica(o que levaria a considerar a linguagem mais adequada) e o processo de individuação.

Por outro lado, a desconversão ou declínio do símbolo/sistema simbólico fala de uma mudança em relação a percepção tanto do símbolo quanto da realidade do sujeito. A desconversão envolve uma crise, um descanto, associada ao um processo um reforçamento das funções racionais e objetivas do Ego. Sobre esse processo de desconversão, Hollis comentou

A divindade transborda da casca, confere numinosidade a ela, e quando o ego humano busca consertá-la, adorá-la e constringi-la aos serviços da agenda de segurança do próprio ego, o deus “morre”, o que quer dizer, ele abandona a casca para reencarnar em outro lugar. (…) (HOLLIS, 2005, 108)

Nesse aspecto, podemos pensar a desconversão podem se dar em função da “agenda do ego”. Ou seja, a experiência funcional, utilitária voltada para suprir necessidades do ego. Esse processo é sutil e lento que restringem e diminuem a possibilidade da experiência simbólica (isto é, estruturante e energética) que sustenta e integra as possibilidades de vida. A agenda ou necessidades do Ego promove uma adesão a grupos e eventos religiosos para usar do sagrado. Muito do trânsito religioso em grupos e igrejas se dá por “adesão” e não conversão, ou seja, uma mudança voltada para mais para uma de ambiente (estética ou litúrgica), relacionamentos interpessoais visando as necessidades do Ego.

Muitas vezes, não significa uma saída de uma instituição religiosa ou grupo mas, uma vivencia medíocre e desprovida de significado interior. O declínio simbólico torna a realidade menos colorida, não indicaria um processo patológico, mas sem o mistério, sem abertura apenas a realidade “nada mais que” a realidade.

Hollis aponta também “(…)Eles cometem o mais antigo dos pecados religiosos, a idolatria, ao adorar a imagem de deus que eles criaram. (…)” As imagens, representações são meios através do qual da consciência se relacionar com a potência arquetípica. São o meio, não o fim. Muitas vezes ficamos inebriados pela representação e nos fixamos nela. Isso leva a uma relação faseada. Clarice Lispector, no conto “Perdoando Deus”, nos ajuda ampliar a percepção, ela nos diz

Enquanto eu imaginar que “Deus” é bom só porque eu sou ruim, não estarei amando a nada: será apenas o meu modo de me acusar. Eu, que sem nem ao menos ter me percorrido toda, já escolhi amar o meu contrário, e ao meu contrário quero chamar de Deus. Eu, que jamais me habituarei a mim, estava querendo que o mundo não me escandalizasse. Porque eu, que de mim só consegui foi me submeter a mim mesma, pois sou tão mais inexorável do que eu, eu estava querendo me compensar de mim mesma com uma terra menos violenta que eu. Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo de minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe. (Lispector, 1998, p.)

Esse é belo texto, que nos ajuda a entender a idolatria que que Hollis nos fala – “o adorar a imagem de deus que eles criaram”. As compensações das falhas, dos medos, inseguranças e defesas do Ego criam, na fantasia, um simulacro de Deus, dos deuses ou da vida. Enquanto a experiência de contato for limitada ao desejo ou as necessidades do Ego, a representação se vincula ao ego seja pela busca de uma resposta, uma necessidade ou uma idealização do que o ego jamais será. Assim, essa representação será sempre um espelho de Narciso, um reflexo distorcido de suas próprias insuficiências.

The Narcissus Myth: Early Poets and Versions of the Ancient Story

A desconversão ou o declínio de um símbolo apontam a transição que conduzirá a uma nova conversão (ou emergência). Para tanto é necessária uma mudança na mudança na atitude do Ego, uma abertura para a honestidade da própria insuficiência. Sem honestidade e constrição o Ego continuará criando uma realidade vazia, a sua própria imagem e semelhança. 

Referencias bibliográficas

ÁVILA, Antonio. Para Conhecer a Psicologia da Religião. São Paulo: Loyola, 2007.

FREITAS, Denis de; HOLANDA, Adriano Furtado. Conversão religiosa: buscando significados na religião. Gerais, Rev. Interinst. Psicol.,  Juiz de Fora ,  v. 7, n. 1, p. 93-105, jun.  2014 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-82202014000100009&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  06  jul.  2020.

JUNG, Carl G, Psicologia da Religião Ocidental e Oriental. Petrópolis: Vozes, 1980.

LISPECTOR, Clarice. Perdoando Deus. In: Felicidade Clandestina. Rio de Janeiro: Ed. Rocco, 1998.

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Fabrício Fonseca Moraes (CRP 16/1257)

Psicólogo Clínico de Orientação Junguiana, Especialista em Teoria e Prática Junguiana(UVA/RJ), Especialista em Psicologia Clínica e da Família (Saberes, ES). Diretor do Centro de Psicologia Analítica do CEPAES. Formação em Hipnose Ericksoniana. Coordenador do “Grupo Aion – Estudos Junguianos”  desde 2012 Atua em consultório particular em Vitória desde 2003.

Contato: 27 – 99316-6985. /e-mail: fabriciomoraes@cepaes.com.br/ Twitter:@FabricioMoraes

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Novo Episódio no Podcast!

Temos novo episódio em nosso PodCast! O Tema de hoje é “O Sapateiro e os Duendes: pensando a nossa relação com o inconsciente” é uma reflexão bem interessante conduzida pela Dra. Kelly Tristão!

Para assistir basta clicar aqui

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