Post do Insta: Bulimia e Psicologia Analítica

A bulimia pode ser entendida como uma desordem do self, marcada por falhas nos processos de integração e reintegração psíquica. Esses déficits têm origem em um vínculo inicial comprometido entre mãe e bebê, especialmente quando a mãe não consegue “segurar” o bebê em sua mente de forma sintonizada. Sem essa base segura, desenvolvem-se defesas primárias que criam barreiras entre o self e o ambiente, prejudicando a capacidade simbólica – essencial para transformar experiências internas em crescimento emocional. Nessa ausência, a comida surge como substituto simbólico, usada tanto para preencher um vazio afetivo quanto para evitar colapsos psíquicos.

Na clínica, mulheres jovens com bulimia frequentemente apresentam uma função simbólica empobrecida, demonstrando dificuldades em criar significados a partir de suas experiências. A relação com a comida reflete uma tentativa de estabilizar um EU frágil, sendo a compulsão e a purgação usadas para expulsar simbolicamente partes “ruins” do self, como raiva ou sentimentos tabu. Ao mesmo tempo, essas mulheres relatam memórias de negligência ou abuso parental, com pouca ou nenhuma lembrança de nutrição emocional positiva. O vínculo transferencial, portanto, é atravessado por medos de falhas empáticas e uma resistência à dependência do analista, refletindo a ambivalência em confiar no cuidado de outro.

Arquetipicamente, essas pacientes oscilam entre a imagem da mãe nutritiva, almejada mas inatingível, e a mãe devoradora, que castra e ameaça. Essa dinâmica se projeta no analista, evocando tanto desejo de cuidado quanto medo de fusão. Nesse contexto, a bulimia emerge como um mecanismo de defesa contra o vazio emocional, perpetuando um ciclo de dependência e rejeição do cuidado externo. O trabalho analítico requer sensibilidade contratransferencial para acolher e traduzir essas vivências corporais e psíquicas em significados integrados.

O tratamento demanda a construção de um espaço analítico seguro, onde a paciente possa explorar suas experiências internas sem se sentir sobrecarregada, permitindo o desenvolvimento de uma função simbólica que promova a integração e a reorganização do self.

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Psicóloga Clínica Junguiana; Doutora em Psicologia com enfoque em Saúde Mental Infantojuvenil (UFES); mestre em Psicologia com ênfase em saúde mental; e especialista em Psicologia Clínica e Familia e em Psicologia Analítica. Atualmente está fazendo no Pós-doutorado na temática de Transtornos Alimentares pelo PPGP da UFES, e pós graduação em Transtornos Alimentares e Obesidade pela PUC/RJ. Com experiência de mais 20 anos na Clínica Junguiana, tem experiência: na Psicologia Hospitalar e Saúde Mental; e na coordenação de oficinas de arte e grupos terapêuticos. E é professora de ensino superior. Pesquisadora na área de Saúde Mental (com diversos artigos científicos e capítulos de livro publicados), associada do Colégio Brasileiro de Medicina do Estilo de Vida, e também é facilitadora de Grupos de Estudos sobre Feminino e Psicologia Analítica. No Cepaes, atua como psicoterapeuta individual de adolescentes e adultos, casais e familia. supervisora clínica e professora. Instagram: @kellytristao.psi

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